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17 de Junho de 2020

Delegado propõe mudança na legislação em prol do idoso hipervulnerável

Delegado propõe mudança na legislação em prol do idoso hipervulnerável O delegado Gabriel Nogueira Jr., titular da Delegacia Especial de Atendimento ao Idoso e à Pessoa com Deficiência em Aracaju/SE, defendeu nesta terça-feira, 16, a sua tese de doutorado em Direito Público na UFBA...

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O delegado Gabriel Nogueira Jr., titular da Delegacia Especial de Atendimento ao Idoso e à Pessoa com Deficiência em Aracaju/SE, defendeu nesta terça-feira, 16, a sua tese de doutorado em Direito Público na Universidade Federal da Bahia (UFBA). Com o tema ‘A Tutela Penal da Pessoa Idosa Hipervulnerável: mera expansão do Direito Penal ou necessária proteção a direitos fundamentais’, a pesquisa de três anos resultou em propostas na defesa dos idosos. Além da criação de uma nova categoria jurídica da pessoa idosa hipervulnerável, Gabriel defendeu alterações no Estatuto do Idoso e nas legislações influenciadas por esse diploma legal, quais sejam: o Código Penal, a Lei de Contravenções Penais e a Lei de Tortura, com a criação de uma causa especial de aumento de pena. Em entrevista à Adepol, o delegado explica como chegou a essas necessidades de mudanças e como elas podem ser revertidas positivamente no dia a dia do trabalho do delegado. Confira!


Como chegou na escolha do tema de sua Tese de Doutorado?
 

 

Gabriel Nogueira Jr. - Por trabalhar como delegado do Idoso, há mais de 02 anos, percebi a necessidade de uma proteção específica a um grupo de idosos que possuem uma condição ainda maior de vulnerabilidade, que defini na tese como a de pessoas idosas hipervulneráveis.  


O que seria um idoso hipervulnerável?



GN - Ao longo do estudo e elaboração da tese foi proposta a criação de uma categoria nova que seria a da pessoa idosa hipervulnerável. Foram utilizados dois critérios um objetivo/etário que leva em consideração a idade da vítima, no caso a pessoa com 80 anos ou mais. O segundo critério foi o critério subjetivo/da limitação. Nessa situação, será pessoa idosa hipervulnerável, aquele idoso, portanto com 60 anos ou mais e que tiver alguma limitação incapacitante, seja física ou mental, que o impeça de defender-se, por si, da violação de algum direito seu praticada por terceiros.  
 

O sr. está lotado no DAGV e estudou os casos dos anos de 2018 e 2019. Poderia fazer uma análise geral dos casos envolvendo idosos que chegaram a seu conhecimento?


GN - Realizou-se no curso da tese uma pesquisa documental na Delegacia Especial de Atendimento ao Idoso e à Pessoa com Deficiência (DEAIPD) situada no DAGV de Aracaju, tendo como delimitação temporal os procedimentos policiais (IPs e TOCs) instaurados no período compreendido entre 2018 e 2019. Nesses procedimentos ficou evidenciado um inegável recorte de gênero, com uma predominância de vítimas mulheres. Além do tipo preponderante de violência foi a psicológica, na qual estão inseridos os crimes contra a honra, o crime de ameaça e contravenções penais de perturbação.


E sobre os autores, o sr. conseguiu chegar a algum “perfil”?


GN - Consegui mapear também que os principais autores integram o núcleo familiar mais próximo das vítimas. Ou seja, na maioria das ocorrências, o perigo mora ao lado.
 

Atualmente existe legislação para proteger esse público que o sr. denominou de hipervulnerável?


GN - Embora existam diversas leis para proteger os direitos das pessoas idosas, dentre as quais destaca-se o Estatuto do Idoso, não há uma proteção específica para a pessoa idosa hipervulnerável, somente a proteção geral existente para todos os idosos. Além do Estatuto do Idoso há outras leis por ele influenciadas: Código Penal, Lei de Contravenções Penais e Lei de Tortura, mas nestas, de igual modo, não há uma proteção direcionada à pessoa idosa hipervulnerável.


Durante a sua pesquisa, o sr. encontrou resposta:  se o que é necessário é a mera expansão do Direito Penal ou a proteção a direitos fundamentais?


GN - Durante a pesquisa, ao longo da tese, consegui demonstrar que a propositura da criação de uma causa especial de aumento de pena, embora represente uma resposta mais dura do Estado por meio do incremento de pena, ela é necessária para a proteção dos direitos fundamentais das pessoas idosas hipervulneráveis e não configura uma mera expansão do Direito Penal já tão assaz hipertrofiado.


Sua tese propõe uma alteração ao Estatuto do Idoso? Qual seria a mudança?


GN - Com a tese é apresentada uma proposta “de lege ferenda” de lei, que em sendo acolhida pelo Poder Legislativo, alteraria o Estatuto do Idoso, com a criação da categoria do idoso hipervulnerável, além da criação da causa especial de aumento de pena e a padronização da referência à vítima idosa nos diplomas legais fora do Estatuto do Idoso. Isso porque tanto no Código Penal, quanto na Lei de Contravenções Penais e na Lei de Tortura, há referências diferentes para caracterizar a pessoa idosa. Oras indica-se a pessoa com mais de 60 anos, oras a pessoa maior de sessenta anos, também há referências de pessoa com sessenta anos ou mais. Essa falta de padrão pode gerar dúvidas interpretativas, em especial, no que pertine à pessoa que completa sessenta anos e no dia de seu aniversário é vítima de um crime.     


Por que defende que o idoso merece essa condição especial em lei?


GN - A compreensão de que o idoso hipervulnerável merece uma proteção diferenciada surge do fato de que além de ser uma pessoa mais fragilizada e exposta, além de representar uma expressão máxima da dignidade humana. O Estado ao proteger de forma diferenciada a pessoa idosa hipervulnerável, manda um recado claro à sociedade, se o mais frágil é protegido, toda a sociedade tem condição de também o ser. 


Como seu estudo poderá ajudar no trabalho diários dos delegados de Polícia?


GN - Em sendo a proposta de lei, de lege ferenda, convertida em lei, a apuração de crimes praticados em face dessas pessoas idosas hipervulneráveis possibilitará uma punição mais rigorosa em desfavor desses agressores.

Contudo, a pesquisa aponta outras perspectivas para o enfrentamento à violência contra a pessoa idosa, entendendo que, embora importante, o Direito Penal não é suficiente para resolver o problema proposto.


Como o resultado da pesquisa documental realizada na DEAIPD, que foi corroborada por dados do CNJ, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e do Disque 100 do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, revelou um tipo de violência preponderante, os perfis de autores e vítimas, além do vínculo entre eles foi possível pensar em outras alternativa para o enfrentamento à violência que seriam importantes medidas, dentre elas: políticas públicas voltadas para a família da vítima idosa hipervulnerável, com foco especial para os autores.


Ademais, propõem-se a implementação de práticas restaurativas, possibilitando uma resolução mais adequada dos conflitos oriundos da violação de direitos das pessoas idosas hipervulneráveis (e idosos em geral), oportunizando às vítimas a fala e eventuais reparações.     


Conclui-se o estudo propondo intervenções em duas linhas uma voltada para o Direito Penal retributivo (causa especial de aumento de pena no caso da vítima idosa hipervulnerável) e, complementarmente, outra extrapenal e penal consensual como alternativa: políticas públicas voltadas às famílias das vítimas, incluindo os autores da violência, bem como implementação de práticas restaurativas, para a pacificação efetivas dos conflitos.     
 


****Gabriel Nogueira Jr. é doutor em Direito pela Universidade Federal da Bahia, Mestre em Direitos Humanos pela Universidade Tiradentes/SE, Especialista em Gestão Estratégica em Segurança Pública pela Universidade Federal de Sergipe e em Ciências Criminais pela UNAMA/LFG.  Delegado de Polícia Civil no Estado de Sergipe desde 2001, atualmente como titular da Delegacia Especial de Atendimento ao Idoso e à Pessoa com Deficiência em Aracaju/SE.


 

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